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Posso ter dois pais ou duas mães na certidão de nascimento? Multiparentalidade

O conceito social de família vem sendo redefinido, de modo a contemplar os diversos tipos de família existentes nos dias de hoje. O padrão social de: “pai, mãe e filho”, vem sendo modificado, com diferentes tipos de família surgindo, seja através dos casamentos homoafetivos, em que um casal é composto por pessoas do mesmo sexo, ou através de adoção afetiva, em que há o reconhecimento jurídico da maternidade e/ou paternidade, com base no afeto, sem vínculo sanguíneo.

Em todos os casos, o que está presente é a existência de afeto e convivência entre os membros, de modo a constituir a filiação, sem que os laços sanguíneos sejam os mais relevantes para a existência de deveres e direitos. O principal objetivo é a realização pessoal da família como um todo, de modo que surgiam, cada vez mais, demandas sobre a necessidade de respaldo jurídico aos casos em que havia o pedido de registro civil de mais de um pai ou mãe.

É necessário entender, em primeiro lugar, o que seria a Certidão de Nascimento. O Registro Civil é o termo jurídico que designa os assentamentos dos fatos da vida de um indivíduo. Nesse sentido, a Certidão de Nascimento é o documento que comprova o registro civil, a partir do nascimento do indivíduo, contendo, ali, o nome do pai e mãe da criança.

A existência do registro de pai e mãe na Certidão garante direitos e deveres dos pais com seus filhos, das mais diversas naturezas, passando pela simples possibilidade de matricular a criança em uma escola, até a existência do dever de ajudar na subsistência da criança, como da pensão alimentícia em caso de separação dos pais. Além disso, é uma garantia de dignidade ao indivíduo ter o reconhecimento de quem são seus pais ou mães, e daí nascem as demandas da multiparentalidade.

O que ocorre é que a paternidade é uma relação que se constrói pelo afeto e convivência, de modo que a existência de consanguinidade entre os membros é, de fato, a característica menos relevante para existência de uma família. Assim, não é incomum ver crianças que, a vida inteira, foram criadas por madrastas, padrastos, tios, entre outros, requerendo o reconhecimento legal da paternidade desses, como uma forma de afirmação da existência de laços familiares presentes.

Diante dessa demanda, o Supremo Tribunal Federal aprovou a Repercussão Geral 622: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante, baseada na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”. Basicamente, o STF reconheceu a existência da multiparentalidade, que é o parentesco constituído por múltiplos pais, simultaneamente de uma filiação biológica e uma socioafetiva, ou seja, de modo que não há a exclusão de nenhum deles.

Assim, o reconhecimento da socioafetividade, isto é, da relação de afeto criada no âmbito social, é a base para o reconhecimento da relação entre pai/mãe e o indivíduo, de modo a garantir o registro desses como pais, legalmente reconhecidos, evitando diversos constrangimentos decorrentes da não existência de legalidade na relação parental.

Ainda, é importante entender que não há qualquer hierarquia entre o pai biológico e o pai afetivo, da mesma forma que o filho afetivo possui os mesmos direitos em relação ao filho biológico, produzindo efeitos pessoais e patrimoniais.

Em suma, o reconhecimento da multiparentalidade pode ser feito de maneira extrajudicial, observada os provimentos nº 63 e 83 do CNJ – Conselho Nacional de Justiça – a partir da existência dos requisitos abaixo:

– Exclusivamente para filhos acima de 12 anos, que deverão consentir

– Reconhecimento exclusivamente unilateral (somente um pai ou uma mãe socioafetiva)

– Necessidade de apresentação de prova do vínculo afetivo

– Consentimento do pai/mãe biológicos

– Atestado do registrador sobre a existência da afetividade

– Parecer favorável do Ministério Público, que equivalerá ao deferimento

Para os menores de 12 (doze) anos, o reconhecimento extrajudicial é vedado, diante da preocupação com a possibilidade de burlar a adoção destes menores, cuja manifestação de vontade é mais difícil de ser averiguada, diante da pouca idade. Assim, resta a via judicial para estes casos, com a proposição de uma Ação de Reconhecimento de Paternidade Socioafetiva/ Multiparentalidade.

Equipe Quirino e Paixão Advogados

 

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